domingo, 27 de abril de 2025

BESTIFICAÇÃO

Através da TV Justiça, o público assistiu a um espetáculo bestialógico ocorrido na sessão do dia 22.04.2025, da 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF): citações bíblicas disparatadas, quer nas sustentações orais dos advogados, quer nos votos dos juízes. Os ministros Alexandre, Carmen e Dino ironizavam. Isto não se ajusta ao decoro. Tal comportamento seria tolerável no privativo recinto do lanche dos juízes ou do gabinete, porém, impróprio na sessão pública de julgamento. Chacotas e austeridade se repelem. 
O STF é uma instituição política diferente de um tribunal eclesiástico. No estado brasileiro não há religião oficial, embora a nação brasileira seja religiosa. A liberdade religiosa está amparada na Constituição da República. Há brasileiros seguidores de diferentes religiões: cristã, judaica, islâmica, hinduísta, budista, xintoísta, espírita. Há brasileiros livres pensadores filiados a organizações civis como a rosa-cruz e a maçonaria. Por isto, as questões submetidas à apreciação dos tribunais do estado devem ser examinadas e julgadas de modo racional, objetivo, imparcial, sem apelo a escrituras religiosas e místicas. 
Constituição, lei infraconstitucional, costume, princípios gerais do direito, fatos provados, são os elementos que alicerçam decisões judiciais. Preceitos da Bíblia, livro da parcela cristã do povo brasileiro, não devem alicerça-las. A cidadania faculta à parcela não cristã do povo brasileiro, exigir dos tribunais do estado, julgamentos isentos de fundamentação bíblica.
Considerando que as citações bíblicas feitas pelos advogados é que provocaram a zombaria dos juízes, a expressão “juristas da internet” utilizada por estes, atinge a dignidade profissional daqueles. Os juízes entraram no terreno da vulgaridade quando mencionaram a palavra “jurista” como sinônimo de agiota (quem empresta dinheiro e cobra juros). Além do mau gosto e da inadequação do lugar e do momento, a pilhéria arranhou e empobreceu a toga.
Jurista é a pessoa natural que estuda o direito como ciência e o pratica como arte, dedica-se à interpretação e à aplicação das leis no exercício da advocacia, do ministério público, da magistratura e do magistério. Portanto, ao contrário do que disse o ministro Dino, a publicação de livro não é conditio sine qua non para alguém ser qualificado como jurista. 
Caprichoso nos seus gestos teatrais de mãos e braços, confiante na sua imagem e inteligência, esse ministro esqueceu de harmonizar palavra & realidade. Os destinatários do Pentateuco não são os estrangeiros (gentio) e sim os hebreus, povo pequeno, de má índole, cabeça dura (royalties para Moisés), rabeira de culturas superiores (egípcia, babilônica, assíria, persa, grega).
Afigura-se infeliz a inclusão, na sustentação oral e nos votos, dos evangelhos contidos na Bíblia, porque há outros inúmeros evangelhos que ficaram de fora e que podem alterar a visão da cristandade. Jesus, profeta hebreu galileu, nada deixou por escrito. A doutrina atribuída a ele nos 4 evangelhos é apostólica e não jesuítica. Quem primeiro escreveu sobre Jesus foi Paulo de Tarso, que não o conheceu. Paulo intitulou a si próprio de “apóstolo” para competir com a autoridade de Pedro, este sim, apóstolo da primeira hora. Paulo, que era judeu fariseu e conhecia a escritura judaica (Torá), instituiu o cristianismo no molde farisaico e saiu a pregar fora do território judeu. As raízes da igreja, pois, são paulianas e não jesuíticas. Jesus não fundou igreja alguma. A Bíblia é uma coleção de contos da carochinha (royalties para Albert Einstein). A fé cega é a estupidez humana elevada ao grau máximo. 
Amparado no Antigo Testamento, o ministro Dino refere-se aos hebreus (judeus + israelitas = hebreus) como “Povo de Deus”. Esse “povo de deus” é o mesmo que, atualmente, inferniza a vida dos povos vizinhos, massacra os palestinos e não acata decisões do tribunal internacional. 
Javé, ou Jeová, cruel, vingativo e genocida deus nacional dos hebreus criado por Moisés, príncipe egípcio, difere do Pai Celestial, deus amoroso, misericordioso, universal e único, criado por Jesus, profeta hebreu israelita galileu. 
Quando os semitas ainda eram politeístas, a doutrina monoteísta já era conhecida no Egito. Vigorou oficialmente de 1379 a 1362 a.C., no governo do faraó Amenhotep IV (Ikhnaton). Aton era o deus universal, único, simbolizado pelo Sol. 
Arrelientos e forasteiros em Canaã, os semitas foram apelidados de hebreus pelos cananeus, palavra com o duplo significado de bandidos e nômades. “Povo de Deus” é toda a humanidade e não uma única nação. O deus que criou o universo é um deus universal e não um deus nacional.
“A democracia não pode ficar à mercê dos filisteus”. Dito assim, pelo ministro Alexandre, faz parecer que os filisteus eram bandidos. Esse povo conquistou Canaã e submeteu os povos que lá habitavam, entre os quais: (i) cananeus nativos (ii) hebreus adventícios que haviam chegado 50 anos antes dos filisteus. Canaã passou a ser chamada Filistia, que significava "terra dos filisteus". Latinizou-se Palestina. Eles permaneceram 500 anos na Palestina (1.100 - 604 a.C.), fundaram 5 cidades, sendo Gaza a maior delas. O povo hebreu, no reinado de Davi (1001 - 961 a.C.), conseguiu recuperar parte do território e manter os filisteus acantonados no sul da Palestina. Filisteus e hebreus sucumbiram diante dos exércitos assírio e caldeu.       
“Nesta fase não há o que perdoar. Sabiam o que estavam fazendo”. Ao dizer isto, a ministra Carmen (i) referia-se à fase do recebimento da denúncia, à consciência dos rebeldes e ao perdão inoportuno (ii) mostrava estar convencida de que os acusados agiram dolosamente. O clima evangélico da sessão envolveu o tema do perdão. Jesus perdoaria. O estado não perdoa. Encerrado o devido processo legal, cogitar-se-á do perdão se a decisão for condenatória.   

Bíblia Sagrada. São Paulo. Editora Ave Maria. 58ª Edição. 1987.
Constituição da República Federativa do Brasil. 1988.
Lei Orgânica da Magistratura Nacional. Lei Complementar 35/1979.
Estatuto da Advocacia. Lei 8.906/1994.
Breve Historia de las Religiones. Francisco Diez de Velasco. Madrid. Alianza Editorial. 2008.
História da Civilização Ocidental. Edward McNall Burns. RJ/SP/RS. Editora Globo. Volume I.  3ª Edição.  1955.
Um Estudo Crítico da História. Helio Jaguaribe. São Paulo. Paz e Terra. Volume I. 2ª Edição. 2001.
            

domingo, 20 de abril de 2025

ASILO

A opinião pública agitou-se com o asilo concedido à esposa do ex-Presidente da República do Peru. Pesou a favor da concessão, a questão humanitária: a mulher padece de grave doença e convalesce de cirurgia a que foi submetida. Ademais, o filho, menor de idade, ficará longe dos pais se efetivada a iminente prisão da mãe. Daí, a urgência do asilo. Pesou contra a concessão, a existência de condenação por crime comum sentenciada pela justiça peruana. 
Informam a garantia do asilo, as ideias de abrigo, de refúgio e de proteção a quem sofre ameaças ou violações aos seus direitos à vida, à liberdade, à igualdade, à propriedade, à segurança pessoal. Entende-se por asilo, o lugar onde encontram amparo pessoas necessitadas e/ou perseguidas por motivos políticos, econômicos e/ou sociais como raça, sexo, cor, idade, pobreza, saúde. 
Serviam de asilo, inclusive a criminosos perseguidos: (i) templos religiosos na Antiguidade (ii) igrejas cristãs e casas dos senhores feudais na Idade Média (iii) hospícios para adultos e crianças pobres ou doentes. 
Tradicional e consuetudinária, pois, a vigência de princípios morais na comunidade internacional, tais como: solidariedade, lealdade, justiça, boa-fé, mútua assistência, cortesia na esfera diplomática (comitas gentium = decoro, respeito mútuo, conveniência, gentileza, etiqueta).
“As relações entre os estados regem-se pelos mesmos princípios de moral que as relações entre os indivíduos”. 
Nas relações internacionais, asilo é instituto de direito nos estados signatários de tratados e convenções (ubi commercium ibi jus). "Todo homem, vítima de perseguição, tem o direito de procurar e de gozar asilo em outros países". O asilo por crime político e a extradição por crime comum passam a integrar, a partir do século XIX, a ordem jurídica de estados europeus e americanos. No exercício do civilizado e constitucional direito de petição, os interessados solicitam asilo. O estado destinatário do pedido não está obrigado a deferir e a explicar o motivo do indeferimento. Trata-se de matéria imbricada na soberania nacional. O governo examina a oportunidade e a conveniência de conceder ou de negar o pedido de asilo. A tarefa de conduzir o/a solicitante para fora do seu país cabe ao estado concedente. A expedição do salvo-conduto cabe ao estado de origem. 
No Brasil, "não será concedida extradição de estrangeiro por crime político ou de opinião". Portanto, no Brasil, será concedido asilo a estrangeiro quando acusado, no seu país, da prática de crime político ou de opinião. A concessão de asilo é princípio constitucional. [Assim também é no Peru e em outros países americanos]. Em tempo de paz, "qualquer pessoa pode entrar, permanecer ou sair do território nacional". Estrangeiro dentro do Brasil, pede asilo territorial; fora do Brasil, pede asilo diplomático. Cabe ao governo brasileiro deferir ou indeferir o pedido.  
Se não transitou em julgado, a sentença penal condenatória do/da solicitante não é óbice à concessão do asilo. Nos pedidos de asilo e de extradição aplica-se o direito brasileiro e não o direito estrangeiro. O governo italiano, por exemplo, já teve pedido de extradição indeferido porque o crime de que era acusado o extraditando estava prescrito segundo a lei brasileira. No caso peruano, a informação de que “cabe recurso” indica que a sentença não transitou em julgado. O respectivo processo ainda está em trâmite pelas instâncias hierárquicas do Poder Judiciário. Portanto, mesmo que a lei peruana permita a imediata execução da pena antes do trânsito em julgado da sentença, o direito brasileiro não permite. "Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória". Destarte, do ponto de vista jurídico, aqui no Brasil, a esposa do ex-presidente do Peru não pode ser tratada como culpada. 
Condenação em processo criminal também não impede a concessão do asilo se o ato tipificado como crime comum for conexo à política partidária, à oposição ao governo e/ou à ideologia política dominante. No Brasil, há o exemplo do processo judicial movido contra o então candidato à presidência da república, baseado na fraudulenta operação lava-jato. A sentença condenatória percorreu as instâncias ordinárias e especial para, finalmente, ser cassada pelo Supremo Tribunal Federal em razão dos vícios e do espírito ideológico e político-partidário que a envolviam. Constatou-se conluio entre juiz e agente do ministério público federal no duplo propósito de (i) impedir o réu de disputar o cargo de presidente da república (ii) favorecer a eleição do candidato da extrema direita. Este caso exibiu ao mundo os pendores partidários e nazifascistas dos magistrados federais que dele participaram. Outrossim, compõe iter criminis o uso ilícito de peças de processo anulado. Até o jornalista presidente da Academia Brasileira de Letras sabe, ou devia saber, que liberdade de expressão não significa licença para mentir, injuriar, difamar ou caluniar.
O processo judicial peruano em que a mencionada senhora figura como ré, também pode estar viciado na origem. Grande é a probabilidade de a condenação decorrer do espírito ideológico e do objetivo político-partidário dos julgadores. Aquela senhora não é apenas esposa, mãe e dona de casa, mas, também, cidadã politicamente ativa daquele país, com sua ideologia, seus projetos e sua história. Além de a ação penal por crime comum não ter sido julgada em definitivo, a conexão com a vivência política da ré mostra-se evidente. Até o dinheiro supostamente lavado tinha finalidade política: campanha eleitoral.

Assembleia Nacional Constituinte. Constituição da República Federativa do Brasil. 1988. Artigos: 4º, X e 5º, XV + LII + LVI + LVII + XXXIV, letra a
Assembleia Geral das Nações Unidas. Declaração Universal dos Direitos do Homem. 1948. Artigo XIV, item 1.
Convenção da Organização dos Estados Americanos. Asilo diplomático. Caracas. 1954. Artigos I, II, IV/VI, XIII. Incorporada ao direito brasileiro por decreto 42.628/1957, expedido pelo presidente Juscelino Kubitschek. 
37ª Conferência da União Interparlamentar. Roma. 1948. 
Lei de Introdução ao Código Civil. Decreto-lei 4.652/1942. Artigo 15, letra c.  
Curso de Direito Internacional Público. Celso D. Albuquerque Mello. Rio de Janeiro. Freitas Bastos. Volume II.  8ª Edição. 1986. 
Introdução ao Direito Internacional Público. Nelson Ferreira da Luz. São Paulo. Saraiva. 1963.  

domingo, 13 de abril de 2025

MAGA

Donald Trump, presidente dos Estados Unidos da América (EUA), parece usar a frase Make America Great Again (MAGA) como se fosse mantra hinduísta para obter ajuda divina na realização do seu projeto de recuperar a hegemonia do seu país no concêrto das nações. O mantra indica que o presidente está em busca da hegemonia perdida, à semelhança de Marcel Proust "em busca do tempo perdido", obra que levou 15 anos para ser concluída (1907-1922). Donald concluirá a sua obra em 8 anos (2025-2033), se vencer a oposição interna e externa, se for reeleito e se viver até lá.  
Os antecedentes do projeto Trump localizam-se no século XX, anos 1989-1991, quando a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) desmoronou e os EUA, sem a concorrência soviética, ficaram hegemônicos. 
No seu governo iniciado em 1985, Mikhail Gorbatchov adotou duas políticas centrais: (i) a glasnost = transparência, que ampliou a liberdade de expressão e de imprensa e atenuou o autoritarismo (ii) a perestroika = reestruturação, que enveredou para o sistema econômico ocidental ao descentralizar as decisões no campo da economia. A confluência dessas duas políticas foi o principal fator da desagregação da URSS. 
Ao adotar essas duas políticas, Gorbatchov saltou da órbita da democracia socialista (povo proprietário dos meios de produção) para a órbita da democracia social (propriedade privada dos meios de produção + intervenção estatal), à semelhança do que acontece no interior do átomo, quando um elétron salta de uma órbita para outra. O princípio da incerteza no microcosmo foi deduzido desse fenômeno.  
O princípio da incerteza está presente também no macrocosmo, no mundo da cultura em particular, esfera das relações humanas, dos conhecimentos humanos, das ações humanas, das obras humanas, das instituições humanas. O mundo da cultura é o mundo das certezas incertas. O governante soviético não esperava a demolidora reação intestina às suas políticas.   
O salto de Gorbatchov de uma órbita a outra facilitou o acordo. Ele, presidente da URSS e Ronald Reagan, presidente dos EUA, reuniram-se e selaram o fim da guerra fria. A federação soviética foi para o espaço e se desvaneceu no tempo. Restou intacta apenas a federação russa. Para os socialistas, Gorbatchov foi um traidor. Para os capitalistas, Gorbatchov foi um herói premiado inclusive com o Nobel da Paz.   
Donald, atual presidente dos EUA, quer imitar Ronald, ex-presidente. Ele pretende dialogar com Putin, atual presidente da Rússia, pacificar a guerra quente e, com jeitinho, desagregar a federação russa. Todavia, hoje o clima da política internacional está mudado, não é o mesmo clima do século XX. Desta vez, provavelmente, o presidente russo não se emocionará e nem se impressionará com o canto de sereia do presidente americano. 
Neste século XXI, a ascensão da China e da aliança BRICS+ modelou uma ordem multilateral refratária à hegemonia americana. A agressividade para reconquistar a hegemonia perdida valendo-se de artifícios econômicos como, por exemplo, o aumento das tarifas sobre os produtos importados pelos EUA, será um tiro a sair pela culatra, como indicam as reações de países da aliança BRICS+. Eventual reconsideração do presidente americano não será vista por ele e por seus asseclas como recuo e sim como revisão de estratégia
Alguns vira-latas dos setores públicos e privados da nação brasileira lambem as botas do presidente dos EUA e chegam ao cúmulo do servilismo quando batem continência à bandeira daquele país. Os vira-latas nascidos nos períodos colonial e imperial da história do Brasil, olhavam com veneração, inveja, espírito servil, países europeus como, por exemplo: Portugal, Inglaterra, França. Os vira-latas nascidos no período republicano da história do Brasil, olham com veneração, inveja, espírito servil, o governo dos EUA. 
Esses vira-latas formam a maioria do povo brasileiro e são encontrados no campo, na cidade, nas ruas, nas praças, nos quartéis, nos templos religiosos, nos estabelecimentos de ensino, nas emissoras de rádio e televisão, no comércio, na indústria, nos sindicatos, nas organizações civis autônomas, nos partidos políticos, nos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. Talvez sejam necessários mais 500 anos de história para que essa maioria passe a ser minoria ou desapareça. Então, os brasileiros terão pedigree, auto-estima fortalecida, ampla consciência do seu próprio valor, sem complexo de inferioridade diante dos demais povos. 

domingo, 6 de abril de 2025

JUIZ EMOTIVO

Na recente sessão em que o Supremo Tribunal Federal (STF) recebeu a denúncia criminal oferecida pelo Procurador-Geral da República contra Jair Messias Bolsonaro e outros, ouviu-se a expressão "debaixo da toga pulsa um coração" dita por um dos ministros. Provavelmente, a intenção do poeta foi a de, com aquela frase, lembrar ao público e à imprensa, de que os juízes têm sentimentos que podem influir nas suas decisões. A citada expressão lembra a metáfora: “No peito de um bruto também bate um coração”. Lembra, também, o título de célebre faroeste do século XX: “Os brutos também amam”.
Por esta senda, o ministro entendeu que as penas aplicadas aos condenados pela rebelião de 8 de janeiro de 2023, iter criminis da tentativa de golpe contra o estado democrático de direito, deviam ser revistas e atenuadas porque os julgamentos foram realizados sob violenta emoção dos julgadores. 
Assim se manifestando, o ministro atribuiu a si mesmo e aos seus colegas da 1ª Turma do STF, descumprimento dos deveres de exatidão, independência e serenidade, atribuídos aos magistrados por lei orgânica da magistratura nacional (Lei Complementar 35/1979, artigo 35, item I). O descumprimento desses deveres retira a credibilidade do órgão julgador. 
Na judicatura estão implicadas a racionalidade e a sensibilidade dos magistrados, objetividade e um toque de subjetividade. Se assim não fosse, os julgadores não seriam humanos. Por serem humanos, os magistrados têm seus acertos e seus erros durante a judicatura. Por serem portadores de cultura jurídica, de formação moral acima da média e do explícito dever de manter conduta irrepreensível na vida pública e na vida privada, os magistrados devem estar mais próximos do certo do que do errado, da verdade do que da falsidade, do justo do que do injusto. Os erros intencionais são indesculpáveis, moral e juridicamente ilícitos e sujeitam os magistrados às punições previstas em lei.    
Se, no curso do processo judicial, o magistrado sentir violenta emoção, deverá se afastar do julgamento e se declarar suspeito, consoante regras processuais. 
No caso em tela, a confissão do ministro acarreta a nulidade dos processos judiciais referentes ao movimento subversivo de 08/01/2023, porque as ações penais respectivas foram julgadas sob violenta emoção dos juízes da 1ª Turma do STF. Não se trata, pois, de revisão das penas aplicadas e sim de nulidade processual insanável por violação do artigo 5º, inciso LIV, da Constituição da República (garantia do devido processo legal) e do artigo X, da Declaração Universal dos Direitos do Homem (garantia do julgamento por tribunal independente e imparcial). Os processos devem ser redistribuídos para a 2ª Turma ou para o Plenário do STF, de acordo com o sistema jurídico brasileiro. 
Juízo emotivo proferido no processo, tanto na esfera cível como na esfera criminal, retira a segurança jurídica das partes e dos cidadãos em geral. Julgando sob violenta emoção, os juízes não asseguram às partes,  tratamento independente, imparcial e isonômico. 
SE os demais ministros da 1ª Turma discordarem do colega e negarem ter julgado sob violenta emoção, a higidez dos processos não será afetada. Nesta hipótese, os ministros poderão rever as penas aplicadas se as entenderem excessivamente rigorosas. Contudo, convém lembrar que os crimes contra o estado são gravíssimos e costumam ser punidos com o máximo rigor de modo a evitar a reincidência. Há países em que esses crimes são punidos com a pena de morte. No Brasil, a pena de morte só é aplicável no caso de guerra declarada, conforme dispõe a letra a, do inciso XLVII, do artigo 5º, da Constituição da República. 
Portanto, o ministro relator do processo errou ao flexibilizar o cumprimento da pena aplicada a uma rebelde subversiva. Com isto e pela incidência do princípio de que todos são iguais perante a lei, o relator abriu as portas do presídio para a saída dos demais condenados pelo mesmo crime. Somente SE os outros ministros da Turma votarem contra essa infeliz decisão, aquelas portas ficarão novamente fechadas como convém.   
A autoria e a materialidade daquele crime estavam evidenciadas por provas robustas e pela prisão em flagrante. A culpabilidade ficou demonstrada na instrução criminal. Durante os trâmites do processo, os réus tiveram respeitados os seus direitos ao contraditório e de ampla defesa. Nenhum deles arguiu nulidade gerada pelo estado emocional dos juízes. O julgamento das ações penais não ocorreu no calor daquele episódio criminoso e sim muito tempo depois. 
Destarte, afigura-se muito difícil acreditar que juízes do mais alto tribunal do país emocionar-se-iam de forma violenta em um caso sub judice, a ponto de perderem o senso de justiça.