Atacado pelo governo dos Estados Unidos e seus satélites da América e da Europa, o governo da Venezuela, em atitude defensiva, sintonizado com fatos do passado e do presente, manifesta a intenção de promulgar lei contra o fascismo.
Como fato de excepcional relevância política, o fascismo nasceu na Itália, no caldo de cultura produzido pela primeira guerra mundial (1914-1918). Trata-se do exercício autocrático do poder político por uma elite civil/militar que acumula as funções legislativa e executiva e se propõe a disciplinar um fenômeno social que considera permanente no seio da humanidade: a luta de classes. Graças à sua proposta de combater o comunismo e preservar a propriedade privada, o fascismo ganhou o apoio de banqueiros, industriais, comerciantes e latifundiários. Auxiliados pela imprensa e pelo rádio, os fascistas usaram a retórica e a propaganda para obter consenso e união do povo. Nacionalismo, autoritarismo, corporativismo, romantismo e pragmatismo impregnam o espírito fascista. Para solucionar os grandes problemas nacionais, a razão é inadequada. Heroísmo, sacrifício, fé mística, força física, capital financeiro e censura são considerados mais adequados. A liberdade política é dispensável.
Benito Mussolini (1883-1945), italiano, professor, jornalista, político, abandonou o marxismo e se tornou o corifeu do fascismo. Posicionou-se à direita do espectro político e passou a odiar os comunistas. Desprezava teoria. O destino da Itália era conquistar e iluminar o mundo como na época do império romano e da renascença. Primava pela ação. L´azione ha seppellito la filosofia (“A ação enterrou a filosofia”). Plagiava o pensamento de Marx: A filosofia explicou o mundo; cabe agora transformá-lo. Prestigiava a indústria, o comércio e a agricultura. Seduzia o povo (populismo). Queria os trabalhadores ao lado dos capitalistas. Buscava o desenvolvimento da nação. Dizia: “O mito é uma fé, uma paixão. Não é preciso que seja uma realidade. O nosso mito é a nação”.
A realidade mostra uma sociedade dividida internamente. A ficção mostra uma nação unitária (mito). Apesar da derrota dos fascistas na segunda guerra mundial (1939-1945), o fascismo sobreviveu infiltrado em partidos conservadores. A direita é conservadora; o fascismo é um filão da direita. Portanto, é natural e compreensível que o governo socialista da Venezuela se acautele diante do inimigo figadal, mormente com a revivência do fascismo no cenário internacional deste século XXI. Governos nazifascistas pululam na América Latina. A oposição ao governo venezuelano está coalhada de fascistas. Qualquer semelhança com o Brasil não é mera coincidência. Apoiada e financiada pelo governo dos Estados Unidos, a oposição pretende formar um governo nazifascista na Venezuela. Poder político relativo é comum à democracia liberal e à democracia social. Poder político absoluto tipifica autocracia, tanto a monárquica como a republicana. Em diversos estados do orbe terrestre, nos limites do ordenamento jurídico de cada um, há governos que funcionam de modo autoritário. O rompimento desses limites enseja ditaduras de direita (capitalistas) e de esquerda (socialistas). Então, novas regras são impostas por quem assume o comanda do estado e mantém o povo sob rédea curta.
A palavra “fascista” nem sempre é usada no seu significado de “adepto do fascismo”. Às vezes, ela é usada só para injuriar o adversário. Neste caso, falta-lhe referência semântica; está servindo apenas como veículo de uma ofensa. Assim acontece, por exemplo, quando alguém diz a outrem: “Você é uma bosta”. A palavra “bosta” nessa frase não tem valor semântico, não está sendo usada no significado de “excremento” e sim como veículo de uma ofensa. A mensagem está implícita. O ofensor está dizendo que o ofendido é uma pessoa desagradável, ou, uma pessoa incapaz de pensar e agir corretamente. No litígio entre a situação e a oposição venezuelanas, o contexto indica que o governante usa a palavra “fascista” não só para xingar os adversários como, também, para identificar a parcela do povo adepta do fascismo.
Assim como os Estados Unidos não querem socialistas no seu quintal, também a Venezuela não quer nazifascistas no seu território. Daí, a iniciativa do governo venezuelano de legislar sobre essa matéria de relevante importância política.
Otávio Mangabeira (1886-1960), brasileiro, engenheiro, professor, político liberal, exilado por duas vezes na Era Vargas, dizia que a democracia era uma planta pequena e frágil. Referia-se à democracia liberal ameaçada pelo fascismo europeu dos anos 1920/1940. Na América Latina caudilhesca, a democracia ainda não amadureceu e nem se fortificou. A democracia igualitária no século XXI, sustenta-se nas potências socialistas (China e Rússia). A democracia liberal sustenta-se nos Estados Unidos em virtude do potencial militar, econômico e cultural dos anglo-americanos concentrados nos dois maiores partidos, ambos de direita: Democrata e Republicano. Lá, os partidos de esquerda são enfeites para que o governo exiba a beleza da sua democracia. Todavia, no uso da liberdade, cidadãos fascistas podem ingressar naqueles dois grandes partidos e subvertê-los, como acontece hodiernamente com Trump no Republicano. Países latino-americanos que imitam a democracia estadunidense assumem o risco de sucumbir diante do fascismo. Destarte, colocar balizas jurídicas à liberdade política nesses países é garantir a integridade do estado democrático de direito. Vade retro fascio!