sábado, 13 de abril de 2024

FUTEBOL III

09/04/2024. Madri. Estádio Santiago Bernabéu. Champions League. Real Madri x Manchester City (3x3). Encontro de dois treinadores de prestígio internacional: Carlo Ancelotti e José (Pepe) Guardiola. O empate indica a paridade de forças entre as equipes por eles comandadas. Da equipe inglesa, Erling Haaland, considerado gênio lá na Europa, no jogo retromencionado não se mostrou à altura da fama. Aqui na América do Sul, temos dúzias de Haalandes. A fama desse jogador decorre da sua função e do seu posicionamento dentro do campo: finalizador parasita posicionado na área adversária para ser municiado pelos companheiros. Isto lhe possibilita fazer gols com alguma facilidade. Se, de um lado, a ele rendeu fama, de outro, o episódio evidenciou, mais uma vez, o fato de nem todo goleador ser necessariamente craque ou gênio, conforme se constata dos jogos de clubes e seleções de 1930 a 2024.  
A esse tipo de jogador finalizador parasita faltam, geralmente, outros fundamentos da arte de jogar futebol, tais como: o drible, o passe, o controle de bola, a visão de jogo. Sem excelência na prática desses fundamentos, jogador algum se qualifica como craque. No Brasil, por exemplo, o parasitário finalizador do Flamengo, em decorrência da sua função e do seu posicionamento na área adversária, faz mais gols do que os companheiros. A imprensa esportiva o incensa por isso, apesar de ele ser um jogador de nível médio.   
A falta de notar, na qualificação técnica dos jogadores, a distinção entre os níveis excelente, bom, médio e sofrível, já causou encrenca entre um treinador da seleção brasileira e um presidente da república. O general Garrastazu Médici, chefe de governo em 1970, apreciador do futebol, torcedor do Grêmio de Porto Alegre, queria ver, na seleção brasileira, o atacante finalizador Dadá Maravilha. O então treinador da seleção, João Saldanha, que preferia atacante genérico, mandou o recado: “O presidente que cuide do governo. Da seleção, cuido eu”. Foi demitido. Mário Zagalo, ponta-esquerda da seleção de 1958, substituiu Saldanha, convocou Dadá, contentou o general. Entretanto, naquela seleção, considerada a melhor do mundo de todos os tempos, Zagalo escalou como titulares no ataque os jogadores: Jairzinho, Rivelino, Tostão, Pelé e Caju (Paulo César Lima). Quanto ao Dadá, ficou maravilhado.  
Como se vê deste caso de 1970, o finalizador parasita nem sempre se encaixa na organização tática do treinador. O atual da seleção brasileira talvez se depare com situação semelhante, caso tenha de escolher entre um atacante finalizador parasitário e um atacante genérico de nível excelente, ao convocar e escalar jogadores. Hoje, não há general na presidência da república com a espada sobre a cabeça do treinador e dos dirigentes do futebol. Há um civil da paz e do amor, nordestino apaulistado, mais esperto do que inteligente, apreciador do futebol, torcedor do Corinthians. Há profissionais da imprensa esportiva, diretores de clubes e da confederação, despreocupados com os aspectos artístico, didático e moral do esporte. Pouco lhes importa se os convocados são honestos ou desonestos, fraudadores ou estupradores. O que lhes importa é a qualificação técnica. Da vida dos jogadores fora de campo não cogitam. No lado oposto, colocam-se os moderados e éticos. Preocupam-se com a imagem do país, com o aspecto artístico e eficiente da seleção, com a honestidade, a  boa forma e o nível excelente dos jogadores. 
Outro problema para o atual treinador da seleção brasileira consiste na situação de Vini Jr., atacante de bom nível. Depois do episódio de racismo na Espanha, o desempenho de Vini, quer no seu clube (Real Madri), quer na seleção brasileira, ficou distante da sua performance anterior. Foi muito significativo e comovente o que, com amargor, tristeza e lágrimas, ele disse na entrevista transmitida pela televisão: “Eu só queria jogar futebol”. Sugere não querer mais. No esporte, ou em outra atividade humana, nem todos têm o mesmo grau de resistência às pressões, aos desafios e às ofensas. Alguns nem reagem. Dos que reagem, nem todos fazem-no do mesmo modo, com a mesma eficácia e com as mesmas cautelas. Há resistências fortes, medianas e fracas, geradoras de múltiplos efeitos no corpo, na alma e no comportamento. Focado pelas câmeras de televisão nos jogos mais recentes, Vini exibe o semblante de jovem amadurecido na estufa, marcas no rosto de quem envelheceu precocemente. Parece que ele perdeu a alegria de jogar e de viver. Talvez, sinais de súplica silenciosa por ajuda da família, dos amigos e de psicólogos. Talvez, alguém deva orientá-lo para que [1] ignore as manifestações dos nazifascistas nos estádios [2] responda mostrando o seu talento em campo e fazendo gols na equipe adversária [3] não revide com palavras e gestos (continência difícil para temperamentos fortes) [4] deixe para o seu clube tomar as providências legais em sua defesa [5] na omissão do clube, procure o apoio de entidades de defesa dos direitos humanos.

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