sexta-feira, 8 de dezembro de 2023

SABER NOTÁVEL

A indicação do Ministro da Justiça para ocupar vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) agitou o Senado Federal, órgão do Poder Legislativo competente para sabatinar o candidato escolhido pelo Presidente da República. Os requisitos a serem preenchidos pelo candidato, segundo dispõe o artigo 101 da Constituição da República, são: (i) idade superior a 35 anos e inferior a 65 anos (ii) notável saber jurídico (iii) reputação ilibada. 
Motivados por venenosa política partidária, os senadores da oposição ao atual governo federal mostram-se propensos a questionar o requisito do notável saber. Disto, subentende-se que os dois outros requisitos não serão questionados ante a sua pública notoriedade.
Em sabatinas anteriores, os senadores não se alvoroçaram tanto como agora. Eles aprovaram até pessoas que não preenchiam o requisito do notável saber jurídico. Certa vez, em sessão do STF, enquanto examinava um caso, o ministro Barroso ironizou o “notável saber jurídico”. Deixou a impressão de que se tratava de algo imaterial, subjetivo, de difícil avaliação e fácil engano. A sabatina tem sido vista como simples formalidade, compadrio dos senadores com o Presidente da República. Em atenção ao constitucional princípio da harmonia entre os poderes, os senadores aceitam a indicação feita pelo Executivo, ainda que o candidato, ou, a candidata, não preencha aquele requisito.  
No processo mental da cognição, o saber é um conhecimento de especial conotação. Resulta da interação do elemento lógico com o dado empírico carregada do convencimento da verdade. O saber notável situa-se acima do conhecimento vulgar e pode ser técnico, artístico, científico, filosófico, religioso. O conhecimento considerado verdadeiro por convenção e/ou por convencimento, qualifica-se como saber quando regularmente aplicado à vida humana, individual e coletivamente; equivale dizer: quando incorporado ao modus vivendi do indivíduo e/ou da sociedade. 
Para ser ministro do STF, a Constituição de 1988, ora em vigor,  exige que o candidato tenha saber jurídico. Essa mesma exigência constou das constituições de 1934, 1937, 1946 e 1967/69. Portanto, não basta conhecer, tem que saber. Não basta ter conhecimento científico do direito. O candidato necessita, ainda, demonstrar que tem sabedoria jurídica. Isto compreende: (i) experiência jurídica, “conhecimento de experiência feito”, no dizer de Camões (ii) proficiência como operador do direito (iii) bom senso. O ministro Octávio Gallotti, do STF, dizia: “O direito é lógica e bom senso”. O conhecimento, a experiência, a proficiência e a sensatez, no caso de ministro do STF, devem ser notáveis, portanto, acima do comum, dignos de nota, ou seja, notórios no ambiente acadêmico, forense, político e social. 
Para caracterizar o notável saber jurídico concorrem diversos indicadores: (i) a docência exercida por vários anos e de forma ilustre em faculdade de direito (ii) a autoria de obra de direito de boa qualidade técnica, científica e literária (iii) o renome como jurista (iv) os títulos acadêmicos autênticos e reconhecidos (v) as aprovações em concursos públicos na área do direito (vi) o efetivo exercício profissional como advogado, defensor público, membro do ministério público, magistrado (vii) o efetivo exercício do poder de legislar e administrar (viii) o efetivo exercício de função jurídica na estrutura de qualquer dos poderes da república, ou, de corporações privadas com sede ou filial no Brasil.   
A pessoa aprovada na sabatina e nomeada para o cargo de ministro do STF leva consigo uma incógnita. A experiência de décadas torna isto evidente. As aparentes qualidades pessoais positivas podem sofrer mutação. O Dr. Jekyll transforma-se no Mr. Hyde. As fraquezas humanas podem macular o caráter do juiz. O espírito público, a imparcialidade, a independência, a serenidade, o senso de justiça, a moralidade, a dedicação exclusiva à judicatura, a assiduidade, a celeridade e a eficiência, tudo isso pode ser aviltado por [a] estímulos financeiros, políticos partidários, ideológicos [b] pressão de indivíduos e grupos [c] ligações perigosas [d] insensibilidade em relação aos sentimentos e aos direitos do povo [e] agressividade no trato com os jurisdicionados [f] ímpeto despótico [g] vaidade.

Nenhum comentário: