quarta-feira, 23 de julho de 2008

IMPEACHMENT DO MINISTRO

Segundo notícia publicada na Tribuna da Imprensa (19-07-2008), a Central Única dos Trabalhadores – CUT, pediu o impeachment do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal – STF. O presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros – AMB, Mozart Valadares Pires, em nota pública, e o presidente do Senado Federal, Garibaldi Alves, em declarações aos jornais, saíram em defesa do ministro e discordaram da iniciativa da CUT. Sustentaram que o impeachment ameaça a independência do Judiciário. Desviaram o ponto central da controvérsia.

Entre os milhares de juízes associados, ampla maioria pode estar a favor do impeachment por entender que o caso merece apuração rigorosa. O presidente da AMB, diante da divisão interna sobre temas polêmicos, deve se abster de falar em nome da classe. No caso CUT x Gilmar, a defesa cabe aos advogados que o ministro contratar e não ao presidente da AMB. Ainda que o magistrado aspire ascender aos tribunais superiores, a presidência da AMB não deve servir de trampolim. Garibaldi ficou impedido de atuar no processo (CPC 135, IV, V). Emitiu juízo antes mesmo de o pedido lhe chegar às mãos, esquecido de que seria um dos juízes do caso. No processo de impeachment cada senador funciona como juiz e tem o direito de apreciar a questão e votar de acordo com a sua inteligência e a sua consciência. O presidente do Senado não pode decidir por todos.

Ao contrário do que afirmam os presidentes da AMB e do Senado, o impeachment não ameaça a independência dos juizes, muito menos, a separação dos Poderes. A causa do impeachment não é o teor da decisão judicial e sim a conduta ilícita do ministro. O processo confirmará se houve abuso de poder, distorção no exercício das prerrogativas do cargo e excesso na função jurisdicional. Equivoca-se, o presidente da AMB, quando afirma que o teor das decisões dos ministros do STF não pode ser alvo de qualquer tipo de censura. Na república democrática, todas as autoridades públicas devem responder por seus atos; todas devem prestar contas e agir com transparência. Ampla é a liberdade de informação e manifestação do pensamento. Essa liberdade inclui a crítica social das decisões dos juízes e tribunais. As decisões judiciais devem ser cumpridas. Negar-lhes eficácia é provocar a desordem geral. Contudo, estão sujeitas à construtiva crítica da sociedade. Na eventualidade de abuso de poder, violação do devido processo legal, dolo ou fraude, os seus prolatores estão sujeitos às penas da lei (CF 52, II; Lei 1.079/1950, 39 e 39-A; CPC 133, I e II). No caso Estado x Daniel, a decisão do juiz foi mais objetiva. Serviram-lhe de amparo os dados contidos no inquérito policial obtidos em alguns anos de investigação. Houve pedido legal do representante do Ministério Público, que entendeu necessária, oportuna e conveniente, a prisão do investigado. Entretanto, na opinião do ministro Gilmar, os motivos que autorizavam a prisão estavam ausentes. A sua decisão foi mais subjetiva.

Acontece que ao julgar o habeas corpus, o ministro: (i) invadiu competência de tribunais federais, o que implica atribuir, ao paciente, foro privilegiado não previsto na Constituição (ii) concedeu a ordem de maneira açodada (iii) decidiu inobstante a fundada suspeição de parcialidade (a irritação do ministro com a polícia federal é pública e notória desde que nome idêntico ao seu foi citado em negócio ilícito; assim, também, sua agressividade em relação ao Ministério Público e ao Ministro da Justiça) (iv) desconsiderou o inquérito policial, a iniciativa do Ministério Público Federal e a capacidade do juiz federal para apreciar a questão de fato e de direito. A conduta do ministro, nesse episódio, autoriza a presunção da existência de ligações ética e juridicamente censuráveis que, se comprovadas, comprometem a sua imparcialidade e honestidade.

No devido processo legal, o ministro terá oportunidade de produzir defesa e provas. Durante a instrução processual poderão surgir fatos que o absolvam. O que não pode é permanecer essa nebulosidade em torno da conduta do ministro. O próprio STF deve se interessar pela devida e ampla apuração dos fatos, inclusive no que tange ao comércio de influências. A nação acompanhará os trâmites processuais. Cuida-se de exercício legítimo da cidadania. O ideal seria a propositura da ação também pelo Ministério Público. Poderá haver mais de uma ação, proposta por diferentes pessoas e instituições contra a mesma autoridade, visando ao mesmo fim: perda do cargo. As ações somam-se. Uma complementa a outra. Todas seguem os mesmos trâmites, em conexão. Isto assegura a prestação jurisdicional adequada e unívoca, além de neutralizar os efeitos nefastos de alguma ação eventual e maliciosamente proposta para garantir a impunidade do acusado.

Nenhum comentário: